pin'artfact - a vida na corda

Um gato a dormir embalado pelo sol, dois olhos que perscrutam toda a rua, plantas na varanda como em jaula de jardim zoológico, roupa pendurada por arames que parecem equilibristas sem corpo, o cheiro a iscas que anuncia a tasca, um piropo que sai a voar pela falha de um dente, uma bandeira cansada a dizer «Porto Campeão», voz de cantor sem valor a sair de um rádio, artista ignorada dentro de casa, dueto que sai pela janela aberta para a rua, mercearia que vende aromas, rótulos de garrafas que lembram o natal em Junho, meia-dúzia de palavrões uns contra outros rua abaixo, olhares trocados entre esquinas, passos indecisos, convite quase em segredo, calor pago que não aquece. Solidão. Por vezes a quietude da rua é quebrada, pelo alvoroço dos rapazes a correrem atrás de uma bola como caçadores atrás da presa. A bola, coitada, esconde-se por baixo dos carros, como corso assustado. Quando não é a bola, é a gargalhada que junta em uníssono gargantas, quando um deles diz em voz alta: «olha! As cuecas da …», apontando para umas enormes cuecas dignas de vestir o boneco da Michelin ...

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